Entrevista com o astronauta Marcos Cesar Pontes

Empresas do Vale fevereiro 7, 2019 Nenhum comentário

Entrevista com o astronauta Marcos Cesar Pontes

ENTREVISTA COM O PRIMEIRO ASTRONAUTA BRASILEIRO 

(*) Matéria exibida na edição 27 – periodicidade abril/maio/2009

Por: José Carlos Reis de Souza

Direto, editor e jornalista da Revista Empresas do Vale – Negócios & Turismo 

Marcos Cesar Pontes, Natural: Bauru–SP, Nascido no dia 11/03/1963, começou a carreira profissional aos 14 anos, ingressou no SENAI e foi ser eletricista aprendiz da Rede Ferroviária Federal (RFFSA) para poder custear seus estudos e ajudar no orçamento de casa. Em 1981 entrou para a Academia da Força Aérea (AFA) em Pirassununga-SP. Em 1984 se formou piloto militar. Especializou-se em aviação de caça, tornando-se instrutor, líder de esquadrilha, controlador aéreo avançado e piloto de testes de aeronaves. Em seu prontuário consta mais de 2000 horas de vôo de caça e de teste em mais de 25 tipos de aeronaves, incluindo; F-15 Eagle, F-16 Falcon, F-18 Hornet e MIG – 29 Fulcrum. Como piloto, participou do primeiro lançamento do míssil ar-ar MAA-1, um dos momentos históricos da aviação nacional. O anuncio informando a sua escolha como o primeiro astronauta brasileiro se deu em junho de 1998, pela Agência Espacial Brasileira (AEB) e pela Agência Espacial Norte-americana (NASA). Marcos Pontes é o primeiro astronauta/cosmonauta brasileiro, o primeiro lusófono e o primeiro da América do Sul a ir ao espaço na missão batizada “Missão Centenário”, em alusão à comemoração dos cem anos do vôo de Santos Dumont no avião 14 Bis, realizado em 1906.

ENTREVISTA

E.V. – Há quanto tempo você trabalha na área de aviação?

M.P. – Eu trabalho há mais de 20 anos na área de segurança de vôo, prevenção e investigação de acidentes aéreos.

E.V. – Além de piloto, você tem outras especialidades dentro da área da aviação?

M.P. – Sim, sou engenheiro aeronáutico, formado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), mestre em Engenharia de Sistemas pela Escola de Pós-graduação da Marinha Americana em Monterey, California. Sou pesquisador na área de sensores, na qual desenvolvi aperfeiçoamentos para sistemas embarcados de detecção de mísseis utilizando lentes polarizadoras.

E.V. – Quantas nações ingressaram para participar deste projeto?

M.P. – O Brasil ingressou no grupo de 15 nações envolvidas com o projeto da Estação Espacial Internacional. Isto aconteceu em 1997 e, no ano seguinte eu fui selecionado pela Agência Espacial Brasileira (AEB) e pela Agência Espacial Norte-americana para representar o Brasil no espaço.

E.V. – Quando foi oficializada a indicação de seu nome para ser astronauta, o que mudou dali para frente na sua vida profissional e familiar?

M.P. – Mudei com a esposa e os dois filhos para Houston (Texas – EUA). Durante dois anos fiquei participando de treinamentos no Johnson Space Center e em dezembro de 2000, fui oficialmente declarado astronauta pela NASA.

E.V. – Como foram as semanas em Moscou que antecederam a viagem?

M.P. – As semanas que antecederam ao lançamento fui submetido a uma rigorosa rotina de exercícios intensivos no Centro Yuri Gagarin, também conhecida como Cidade das Estrelas, em Moscou. Como parte da rotina, passei por testes de sobrevivência em ambientes adversos, utilizei o traje  espacial pressurizado em uma câmara sem ar, participei de uma sessão de  vôos parabólicos, que se dá em uma queda livre do avião por alguns segundos para que pudéssemos ter a sensação de ausência de peso.
As atividades eram realizadas das 8h às 18h, com um intervalo de uma hora para o almoço e, antes e depois de treinar, eu estudava os manuais relacionados à missão.

E.V. – Você poderia descrever como eram os treinamentos?

M.P. – Como parte dos treinamentos na Rússia, participei de testes de sobrevivência em ambientes adversos, utilizei o traje espacial pressurizado em uma câmara sem ar, participei de uma sessão de vôos parabólicos, quando o avião sobe e então descreve uma barábola, em queda livre, este tipo de vôo, os ocupantes tem durante 20 segundos a ausência de seu peso.

E.V. Nesta missão, quem eram os seus companheiros de viagem?

M.P. – Na ida, os companheiros que integraram a missão foram, o comandante russo Pavel Vinogradov e o cel. da reserva americana  Jeffrey Williams e que ficaram por mais seis meses. Na volta, vieram, o russo Valeri Tokariov e do americano William Mc Arthur, tripulantes da Estação Espacial Internacional.

E.V. – Porque você levou para o espaço uma réplica do chapéu de Santos Dumont?

M.P. – Primeiro que foi uma homenagem a Santos Dumont, segundo, porque eu colocava aquele chapéu e a imprensa internacional perguntava, que chapéu é esse, e era exatamente o gancho que eu precisava para falar bem de Santos Dumont: Articulava, essa pessoa, foi quem inventou o avião, fez o primeiro voo dando a volta na Torre Eiffel. Outro pertence era o lenço original com mais de cem anos, que poderia estar no bolso dele durante a decolagem no dia 23/10/1906 e que naquele momento estava comigo no espaço, ligando aquele momento.

E.V. Qual foi à sensação que você sentiu quando chegou ao espaço?

M.P. – O que senti foi algo estranho, estava longe da terra, de meus familiares, amigos e um sonho a realizar, a minha história estava na terra. A cabeça vai a mil por hora, você contido dentro de uma minúscula cápsula, a impressão que dá é que o seu cordão umbilical foi cortado da mãe terra. Toda essa sensação faz com que você pense e raciocine sobre o que você é, o que você está fazendo nesta vida. No espaço você olha a terra e o universo, percebe logo que não é absolutamente nada o físico com restante existente. Você começa a se sentir deprimido. Está é a sensação no começo, depois vem o resgate, que podemos chamar de Deus, Universo ou qualquer coisa, olhando lá fora, você começa a encontrar dentro de si o seu universo, onde você descobre que não é tão pequeno e sim parte de tudo aquilo.

E.V. – Quantos experimentos científicos você levou para a Estação Espacial Internacional?

M.P. – Foram oito experimentos científicos, sendo: Germinação de sementes de feijão (Secretaria de Educação de São José dos Campos), Minitubos de calor (Universidade de Santa Catarina), Efeito da microgravidade na cinética das enzimas, (Faculdade de Engenharia Industrial), Cromatografia da clorofila, (Secretaria de Educação de São José dos Campos), Germinação de sementes em microgravidade (Embrapa e Cenargen), Danos e reparos do DNA na microgravidade (Universidade Estadual do Rio de Janeiro e Instituto Nacional de Pesquisas), Nuvens de interação protéica (Centro de Pesquisas Renato Archer) e Teste de evaporadores capilares em ambiente de microgravidade (Universidade de Santa Catarina).

E.V. – O que você poderia citar como curiosidade?

M.P. – Na realidade no espaço só havia trabalho, nós dormiamos 6 horas e o restante era para trabalhar. A curiosidade pode ser essa, eu tirei mais de 2000 fotos no espaço, justamente no horário em que eu deveria estar dormindo, portanto eu dormia 2 horas, e que o meu médico não saiba.

E.V. – Qual foi o custo desta missão aos cofres brasileiros?

M.P. – O Brasil desembolsou cerca de US$ 10 milhões para a realização desta missão, na realidade a metade o preço real, isto devido a uma parceria entre Brasil e Rússia, um dos principais países envolvidos no projeto da Estação Espacial Internacional.

E.V. – Você poderia descrever um pouco sobre volta do espaço, a entrada  da nave na atmosfera da terra e o resgate?

M.P. – Na despedida da estação, tiramos a última foto próxima à foto do astronauta Gagarin que permanece constante na base espacial, em seguida, eu o russo Valery Tokarev e o americano William Mc Arthur, entramos na nave Soyuz TMA-7, em seguida foi feito à desconexão, três horas de preparação verificando os sistemas se estavam todos em perfeito funcionamento. Tudo certo dá inicio ao retorno, os últimos 28 minutos são de barra pesada. Primeiro você começa no meio do Pacífico, no Sul, cruza a América do Sul, Oceano Atlântico, Norte da África e pousa no Cazaquistão. O primeiro procedimento que a nave faz é a queima de petróleo para reduzir a velocidade para entrar na atmosfera, em seguida é feita à separação por explosivo dos módulos, o que tem lixo e o outro de propulsão, vão desaparecer na entrada da atmosfera. Quanto à cápsula em que nós estamos, não tem nada a fazer a não ser esperar e rezar para que tudo de certo e corra bem. Ela começa a reentrada com 70º de inclinação e com muita vibração, a velocidade é de 28 mil kilômetros por hora, equivalente a média de 25 vezes a velocidade do som, neste momento você começa a ver os retos das partes das separações da espaçonave derreterem. Na reentrada você vai a 5G, você cola na cadeira e a abertura do pára-quedas necessita de toda maneira ser preciso para que não haja um incidente e o impacto no solo é de costa. Em seguida já estão posicionados 17 helicópteros de resgate, em seguida uma série de exames médicos e depois voltamos à Rússia, onde ficamos dez dias no hospital em recuperação e fazendo uma série de exames. Viemos ao Brasil, e tivemos diversas recepções. Voltei para Houston e fiquei três meses sem poder voar, devido a uma hemorragia nos ouvidos. Enquanto isso ficava trabalhando na estação. Finalizando, a Missão Centenário cumpriu todos os objetivos que a Agência Espacial Brasileira colocou.

E.V. – Para finalizar, qual o destino que você tomou para trabalhar e se dedicar profissionalmente após está fantástica missão ao espaço?

M.P. – Após o meu retorno, solicitei a reserva da Força Aérea Brasileira e atualmente trabalho no Brasil e em Houston, permanecendo à disposição do Programa Espacial Brasileiro como astronauta para possíveis futura missões especiais tripuladas brasileiras. No setor privado trabalho como consultor técnico, palestrante motivacional, engenheiro e colunista. No terceiro setor, Pontes é defensor ativo das causas da educação, paz mundial e consciência ambiental.

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