Entrevista com Ozires Silva

Empresas do Vale fevereiro 8, 2019 Nenhum comentário

Entrevista com Ozires Silva

ENTREVISTA COM OZIRES SILVA

(*) Matéria realizada em outubro de 2009 – edição n° 30

 

 Por: José Carlos Reis de Souza

Diretor, editor e jornalista da Revista Empresas do Vale Negócios & Turismo

 

  • Ozires Silva, natural de Bauru-SP., nascido no dia 08/01/1931, formado engenheiro aeronáutico pelo (ITA) Instituto Tecnológico de Aeronáutica, destacou-se na contribuição do desenvolvimento da indústria aeronáutica brasileira. Capitaneou a equipe que projetou e construiu o avião Bandeirante. Em 1970 promoveu a criação da Embraer e deu inicio à produção industrial de aviões no Brasil e presidiu a empresa até 1986. Em seguida presidiu a Petrobras de 19/05/1986 até 21/06/1988. Em 1990 assumiu o Ministério da Infra-estrutura. No ano seguinte retornou a Embraer, onde desempenhou papel importante no processo de privatização da empresa. Foi presidente da Varig no período de 2000 a 2003.

 

ENTREVISTA:

E.V. – O senhor como um dos percussores da Embraer, o que poderia falar sobre uma vida dedicada a ela?

OZIRES SILVA – Não imaginávamos! A Embraer foi criada como uma companhia estatal, porque não conseguimos capitalização privada. Era desejo do governo que ela não fosse estatal, mas ninguém topou financiar uma empresa de fabricação de aviões com projeto nacional. Durante o período de estatal a empresa conseguiu ir bem, produziu vários aviões, conquistou 40 mercados no mundo. Começou com o Bandeirante (primeiro avião fabricado pela Embraer), passou para o Brasília, e depois tivemos bastante sucesso com o Tucano. Até que chegou o final da década de 80, houve a crise internacional do transporte aéreo, o congelamento das poupanças feito pelo governo Collor, o BNDES interrompeu o financiamento de aviões. A Embraer ficou sem condições de financiar aviões porque avião não se vende à vista. O resultado foi que o governo acabou concordando em privatizar a companhia. Privatizada, ela ficou mais fácil de dirigir, com menos restrições do que uma estatal e mais competitiva. De qualquer forma a Embraer teve uma trajetória de sucesso, mas não imaginávamos que atingisse esse porte. O clima para investir no Brasil não é favorável, as condições legais são sempre muito complicadas.

OZIRES SILVA – De que modo à privatização influiu na trajetória da Embraer?

As empresas estatais, tais como conhecemos, foram estabelecidas pelo governo da revolução (governo militar). À medida que o tempo passa, nossa legislação tende a “carunchar” (ficar velha) e o resultado para a Embraer foi uma crise no final da década de 1980, quando o programa de privatização começou. O processo surgiu exatamente porque o governo se enrolou tanto na legislação que as empresas estatais perderam o poder de competição. A Embraer não foi exceção à regra, assim como a Vale do Rio Doce, a Usiminas e outras estatais que não conseguiram sobreviver sob administração governamental. Evidentemente, a Embraer teve sucesso como empresa estatal, mas o sucesso foi se arrefecendo por força de práticas administrativas que restringiam a operação da companhia e a deixavam sem flexibilidade para atuar em um mercado dinâmico como é o internacional. A Embraer tinha tudo para crescer: tecnologia, produtos, equipes competentes, mas era amarrada pela legislação. Com o advento da privatização, a mudança foi da água pro vinho. A companhia esticou sua musculatura e entrou com força no mercado externo.

E.V. – O maior percentual em receitas da Embraer é ocasionado pelas exportações e, qual  é a definição deste conceito?

OZIRES SILVA – Vou reavivar o seguinte: nas décadas de 1930 a 1960, a inflação era um problema seriíssimo, e o Brasil não era um país concorrente. Todas as empresas que passavam a existir se dedicavam estritamente ao mercado interno. Não havia a menor condição de competir lá fora com a agilidade com que atuavam as empresas francesas e americanas.

No entanto, a Embraer foi diferente, nós montamos um programa mercadológico de uma companhia internacional, consciente de que a demanda brasileira não seria suficiente para justificar uma produção de aviões no Brasil. Precisávamos da demanda externa também. Foi por essa razão que nós não fizemos nenhum avião sob licença, produzimos aeronaves com tecnologia nacional.

E.V. – Para finalizar, a Embraer passou por duas dificuldades no mercado da aviação, gerando demissões em massa. O que o senhor poderia dizer dos fatos ocorridos?

OZIRES SILVA – Todas as vezes que ocorreram quedas na demanda de aviões, foram ocasionadas as demissões. Por exemplo, quando ocorreu à crise de 1990, nós tivemos o crescimento do terrorismo internacional, com uma quantidade enorme de ações terroristas nos aviões, o que atemorizou os passageiros e os aeroportos não estavam preparados para o nível de segurança que temos hoje. Para se ter uma ideia, desde a 2ª Guerra Mundial, foi a  primeira vez que o tráfico aéreo internacional e doméstico foi derrubado. Com todos esses problemas, a demanda foi sumindo e os aviões comprados caíram e as fabricantes entraram em dificuldades, ocasionando as demissões.Na década de 90, só a Boeing demitiu 70 mil pessoas. Foi uma crise muito séria. Aqui no Brasil não foi diferente, porque as vendas da Embraer caíram, e ainda tivemos agravantes: o governo Collor decretou o congelamento da poupança. Fez também uma reestruturação no sistema de financiamento à exportação que demorou três anos para ser concluído, e a Embraer ficou sem financiamento para vender lá fora. A Embraer passou o começo dos anos 90 uma dificuldade enorme. Quanto à crise financeira que começou em 2008 nos EUA e nosso maior cliente com 40% das nossas vendas, fez com que a empresa tivesse que ajustar e cortar custos, dentre eles o de pessoal.

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