ENTREVISTA COM O PIANISTA E MAESTRO JOÃO CARLOS GANDRA DA SILVA MARTINS
Empresas do Vale julho 16, 2019 Nenhum comentário
ENTREVISTA COM O PIANISTA E MAESTRO JOÃO CARLOS GANDRA DA SILVA MARTINS, NATURAL DE SÃO PAULO, NASCIDO NO DIA 25/06/1940.
Matéria realizada na edição n° 43, periodicidade: dezembro / janeiro /2012
Pelo: jornalista José Carlos Reis de Souza
Diretor, editor e jornalista da Revista Empresas do Vale – Negócios & Turismo.
Todos nós brasileiros temos orgulho de saber, que o pianista e maestro João Carlos Martins é o nosso maior representante da obra de Bach. Um homem iluminado, perseverante e está à frente da Fundação Bachiana Filarmônica. Começou ainda menino, a estudar piano com a professora Aida de Vuono e, aos oito anos, seu pai o inscreveu em um concurso para executar obras de Bach e ele venceu o seu primeiro desafio de tantos outros que viriam estar em seu caminho. Aos onze anos já estudava de seis a oito horas diárias piano. Teve aulas no Liceu Pasteur, com o maior professor de piano da época, o russo radicado no Brasil, José Kliass. Venceu o concurso da Sociedade Brito de São Petersburgo. Foi escolhido no Festival Casals, dentre inúmeros candidatos das três Américas para dar o Recital Prêmio em Washington. Aos vinte anos estreou no Carnegie Hall, patrocinado por Eleanor Roosevelt. Tocou com as maiores orquestras norte-americanas e gravou a obra completa de Bach para piano. Foi ele quem inaugurou o “Glenn Gould Memorial” em Toronto. Para um pianista, interpetre de Bach e, que era capaz de tocar 21 notas por segundo, não poderia haver pesadelo mais dramático, do que uma lesão em um nervo da mão direita causado por um acidente durante um jogo de futebol em Nova York e, um tumor na mão esquerda, obrigou a abandonar os teclados. Com vários tratamentos, recuperou parte dos movimentos da mão, mas com o passar dos anos desenvolveu a doença chamada “Contratura de Dupuytren”. Novamente teve que parar de tocar, e dessa vez acreditou que seria para sempre. Vendeu todos seus pianos e tornou-se treinador de boxe, querendo estar o mais longe possível do que sua carreira que significava como músico. Mas sua incontrolável paixão o fez retornar, e realizou grandes concertos, comprou novos instrumentos e tentou utilizar o movimento de suas mãos criando um estilo único de tocar e aproveitar ao máximo a beleza das peças clássicas. Utilizou-se da mão esquerda para suas peças e obteve extremo sucesso com essa atitude. Ao realizar um concerto em Sofia na Bulgária, sofreu um ataque durante um assalto, e um golpe na cabeça lhe fez perder parte do movimento das mãos novamente. E ao se esforçar, sofria dores intensas em suas mãos, principalmente na esquerda. Novamente pensou que nunca mais voltaria a tocar. João Carlos Martins perdeu anos de sua carreira em tratamentos, treinamentos e encontrou novamente uma nova maneira de tocar, utilizando os dedos que podia em cada mão, mas a cada dia que se passava vinha diminuindo e tocando menos e menos com o estilo e maestria de antigamente. Essa paixão de João Carlos pela música inspirou um documentário franco-alemão chamado “Die Martins Passion”, vencedor de quatro festivais internacionais – FIPA d’Or 2004, Banff Rockie Award 2004; Centaur com o melhor documentário de longa-metragem, S. Petersburgo; Best Documentary Award, Pocono Mountains Film Festival, USA. Em maio de 2004, esteve em Londres regendo a English Chamber Orchestra, uma das maiores orquestras de câmara do mundo, numa gravação dos seis Concertos Branndenburguenses de Johann Sebastian Bach e, já em dezembro, realizou a gravação das Quatro Suites Orquestrais de Bach com a Bachiana Chamber Orchestra.
Incapaz de segurar a batuta ou virar as páginas das partituras dos concertos, João Carlos faz um trabalho minucioso de memorizar nota por nota, demonstrando ainda mais seu perfeccionismo e dedicação ao mundo da música. Também realizou na Faculdade de Música da FAAM, um programa de introdução à música com jovens carentes. A atuação de resgatar a música para as pessoas que conhecem ou ainda nunca teve contato com ela faz parte deste “momento mágico” em que vive o maestro João Carlos Martins. Trabalha diariamente com pessoas de todas as camadas por querer mostrar que realmente “A música venceu!”. E consegue! Apesar de todas as adversidades, de todas as cirurgias e tentativas de voltar a tocar piano, as limitações físicas o fizeram enveredar para o caminho da regência. Fundou a Orquestra Bachiana Filarmônica e a Orquestra Bachiana Jovem, e hoje, tem sob seu comando mais de 60 músicos.
Estivemos juntos com o maestro João Carlos Martins e aproveitamos a oportunidade para saber um pouco de seu trabalho e carreira, através de uma entrevista gostosa, que nos deu uma lavada sobre superação da vida pessoal e profissional.
V. – Tudo bem maestro João Carlos Martins é, um prazer estar com você novamente?
C. Martins – Tudo bem! É um prazer estar novamente com você José Carlos.
V. – Estivemos em São José dos Campos na inauguração do Teatro do SESI, onde você fez uma apresentação e, hoje estamos aqui em Taubaté na comemoração dos 30 anos da Ladeira Miranda, em que você também faz uma apresentação com palestra.
C. Martins – Verdade, aquela inauguração do maravilhoso Teatro SESI e, que tem a parte interna com poltronas bem confortáveis e a parte externa com uma grande área para receber grandes eventos. Além dos detalhes do hall de entrada.
V. – Durante a sua aprendizagem de lições de piano você estudava quantas horas por dia?
C. Martins – Chegava estudar oito horas por dia, pois, piano se faz com 2% de inspiração e 98% de transpiração.
V. – Quando você venceu o concurso da Sociedade Brito de São Petersburgo, naquele exato momento o que lhe passou pela memória?
C. Martins – Na realidade, o que passava em minha mente é que eu estava levando o nome do Brasil para todos os continentes.
V. – O que representou para você aos 20 anos a sua première no Carnegie Hall?
C. Martins – Foi a Eleanor Roosevelt que fez a minha estréia e sem duvida foi um passo marcante que foi o início de uma tragetória que faz com que aos 71 anos eu continue amando a música.
V. – Eu acredito que outra facanha em sua vida foi a sua presença para a inauguração do Glenn Gould Memorial em Toronto?
C. Martins – No Glenn Gould Memorial eu tive a feliz oportunidade de inaugurar no ano de 1983 e foi um fato marcante também na minha vida.
V. – E a sua passagem pela Escola de Samba Vai-Vai ocaionou mais emoção?
C. Martins – No instante em que você entra na avenida e 30 mil pessoas estão cantando a história de sua vida, é emoção pura.
V. – Outro detalhe, o que se ouve e lê é que qando sofreu o acidente você vendeu todos os seus pianos, porque?
C. Martins – É verdade, porque eu não tinha empresário e ainda imaturo, não podia nem ouvir falar de música, quando eu percebi que o acidente lesou a minha mão. Porém, alguns anos depois, a música fez falta e, voltei com mais amor ainda.
V. – Qual é o segredo para reger uma orquestra sabendo que você não consegue mais segurar a batuta e virar as páginas da partitura?
C. Martins – Na orquestra, só existe a palavra humildade, não se pode ser um maestro com prepotência, mas sim com liderança e, fiz da minha orquestra o meu piano.
V. – Na sua avaliação, que comparações podem ser feitas entre o funcionamento de uma orquestra e o mundo corporativo?
C. Martins – A orquestra, assim como a empresa, tem departamentos definidos com suas próprias funções e responsabilidades. Na orquestra, temos os naipes (primeiros violinos, segundos violinos, violas, violoncelo, sopros de madeiras, metais e percussão), e a empresa seus departamentos. Todos funcionam independentemente, mas sob um único comando ou direção.
V. – Quando um músico não está conseguindo acompanhar a orquestra, quais as medidas que o regente deve proceder?
C. Martins – Cabe ao regente, pelos seus gestos e comandos durante o concerto, orientá-lo para se integrar ao grupo.
V. – Com uma história sublime de superação, é fácil conduzir uma orquestra quando seus músicos o descobrem como exemplo?
C. Martins – Não falo diretamente sobre isso com os músicos da orquestra, citando-me como exemplo para alguém. Quando a gente faz isso, é grande a chance de interpretarem mal e acharem que é vaidade. Acho que cada um tem sua própria maneira de encarar a vida e, se algum exemplo pode ser retirado, seja pelo que se deve fazer ou pelo que não deve ser feito, isso se transmite melhor pelo exemplo diário. Se eu não estudasse todos os dias, como poderia exigir isso de meus músicos? Estudo todos os dias, eles sabem, mas não digo para ninguém, “faça como eu”. Mas, se eles não estudam, eu sei reconhecer e eles sabem disso.
V. – Quais são os preceitos para fazer a orquestra trabalhar em harmonia?
C. Martins – O primeiro está na escolha dos melhores músicos, tanto no aspecto profissional quanto no pessoal. O segundo está em dar a orientação correta para o grupo correto. Não adianta orientar as cordas como se fossem sopros, não vai funcionar. De qualquer forma, a responsabilidade sempre será do maestro, seja na escolha, seja na orientação.
E.V. – No mundo corporativo, existem conflitos de gerações, problemas do mundo globalizado (jovens que não se entendem com os mais velhos), no mundo das orquestras também ocorrem este tipo de problema?
C. Martins – A juventude sempre vem escoltada da inquietude e, os mais velhos, às vezes, podem ser mais intransigentes. Depende de cada um se empenhar em entender o outro, e daí tudo funciona bem.
V. – Como o senhor avalia a carreira de músico no Brasil?
C. Martins — Não é uma carreira fácil. Ainda tem muito que caminhar para o músico brasileiro ser respeitado o tanto que merece.
E.V. – Para finalizar a nossa entrevista, em 2009 e 2010 você fez uma parceria com Chitãozinho e Xororó na comemoração dos 40 anos de carreira deles e viajou o Brasil todo. O que você diria a respeito desse projeto de sucesso?
C. Martins – Foi uma locura, poque mostrei para aquelas pessoas de nariz impinado, a importância da música sertaneja, e para o público da música sertaneja a importância da música classica. Então foi um casamento fantástico.
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